Zélia P. C. Bottino e Eliane S. da Costa Facchio
A matemática está presente em diversas
situações da nossa vida como economia, comércio, indústria, tecnologia, saúde,
construção civil, agropecuária ou nas situações simples do cotidiano como fazer
um bolo, comprar legumes na feira ou verificar as horas.
Cidadãos quantitativamente
alfabetizados precisam conhecer mais que fórmulas e equações. Eles precisam de
uma predisposição para olhar o mundo através de olhos matemáticos, para ver os
benefícios (e riscos) de pensar quantitativamente acerca de assuntos habituais,
e para abordar problemas complexos com confiança no valor do raciocínio
cuidadoso. Alfabetização quantitativa dá poder às pessoas ao fornecer-lhes
ferramentas para que pensem por si próprias, para fazer perguntas inteligentes
aos especialistas, e para confrontar a autoridade com confiança. Estas são
habilidades requeridas para prosperar no mundo moderno. Steen (2001, p. 5)
É preciso ter clareza dos objetivos que buscamos
atingir quando estamos ensinando e avaliando, sem perder de vista o objetivo
maior que é a formação de alunos conscientes, críticos e ativos na sociedade,
garantindo o direito de todos à educação e à constituição de uma sociedade
democrática.
Quando avaliamos procuramos averiguar resultados.
Assim, a avaliação é uma prática social e escolar. Além de servir para conduzir
e melhorar a aprendizagem permite classificar e controlar, servindo como
instrumento de poder e discriminação. Historicamente a avaliação serviu de
mecanismo de seleção dos melhores, excluindo aqueles que passaram a ter acesso
à educação, mas que não se enquadravam nos padrões sociais exigidos. A cultura
da repetência e a culpabilidade do aluno por seu insucesso são formas de conter
o acesso de camadas socialmente mais desfavorecidas, portanto, são questões
éticas e sócio-históricas.
Com os avanços da Psicologia pode-se perceber como
a aprendizagem era vista pela sociedade. A escola tradicional, de influência
behaviorista, valorizava a transmissão de conhecimentos baseada na repetição,
na visão da criança como um ser passivo, que precisa de reforço positivo para a
efetivação da aprendizagem correta. Com os estudos psicogenéticos,
principalmente com as contribuições de Piaget e Vygotsky, passou-se a valorizar
a problematização, o raciocínio, a provocação da compreeensão e não a
memorização.
Segundo Piaget, o pensamento evolui por
meio da interação com o ambiente. Através dos processos de adaptação e
assimilação a criança vai construindo o conhecimento. Num processo dialético
vai se modificando e se adequando às novas estruturas.
O pensamento lógico matemático vai
sendo construído nas interações da criança com o meio. Dessa maneira, através
das relações que a criança estabelece com o objeto do conhecimento, ela evolui
e adquire formas mais complexas de cognição, superando o pensamento individual
e perceptivo, tornando-se capaz de agir de modo cooperativo e abstrato.
Nos dois anos iniciais de vida, a
criança conhece o mundo por estímulos sensório motores, seu desenvolvimento se
dá à medida que consegue controlar sensações e movimentos. Dos dois aos sete
anos o pensamento se caracteriza pela repetição e domínio das ações.
O terceiro estágio, dos sete aos 12
anos é caracterizado pelo raciocínio lógico, sendo que as ações são baseadas no
pensamento concreto, sendo mais objetivas e menos egocêntricas. O último
estágio, compreendido pela adolescência, é marcado pela capacidade de
raciocínio abstrato, em que se é capaz de utilizar o pensamento baseado em
hipóteses, sem a necessidade de fatos concretos.
Portanto, o desenvolvimento cognitivo
depende do meio social e da ação mental da criança sobre os objetos de sua
interação. Assim, o pensamento lógico matemático ou o aprender matemática
depende do desenvolvimento das estruturas mentais, as quais podem ser
estimuladas pelas experiências significativas que propiciam o avanço de um
estágio inicial para outro mais avançado.
Segundo Constance Kamii, a criança não
aprende Matemática memorizando ou repetindo, mas resolvendo situações-problema,
é através da reflexão que a criança constrói conhecimentos.
Reforçando a importância da construção do
conhecimento, Vygotsky enfatiza a importância da interação, sendo que o que o
aluno poderá fazer amanhã sozinho, pode fazer hoje com ajuda do professor ou
dos colegas.
O aprendizado que tem sua origem no interior do
individuo, é um processo em construção através da interação com o outro. Com
base nesse pressuposto não podemos culpar o aluno pelo insucesso escolar, porém
podemos concluir que o professor tem papel fundamental na mediação do
conhecimento. Os estímulos, fornecidos pelo meio social, são formadores de
estruturas cognitivas mais complexas que impulsionam o desenvolvimento da
inteligência. Assim, o grande desafio é estimular os alunos na construção do
pensamento lógico-matemático de forma significativa.
Partindo dos estudos de Piaget e
Vygotsky considerados aqui, propomos o trabalho com a matematização, ou seja,
propor situações problema em vários níveis, pois nas relações interativas as
estruturas cognitivas se ativam e geram estruturas mais complexas ampliando o
conhecimento. Nesse contexto, o professor atua como mediador do conhecimento, o
que era processo interno se exterioriza e se desenvolve.
Complementando com os estudos de
Gardner, que afirma que possuímos um potencial biopsicológico que pode ser
ativado, são as múltiplas inteligências ou competências de que o ser humano
dispõe e faz com que cada um seja e aprenda de forma diferente.
Da minha perspectiva,
a essência da teoria é respeitar as muitas diferenças entre as pessoas, as
múltiplas variações em suas maneiras de aprender, os vários modos pelos quais
elas podem ser avaliadas, e o número quase infinito de maneiras pelas quais
elas podem deixar uma marca no mundo. (Gardner)
Precisamos superar a concepção de que a
criança é mero receptor de conhecimento e abandonar a ação do professor como
transmissor de conhecimento. Nesse sentido, o ensino da matemática padece de um
constante erro, começa pelo fim, pela apresentação de conceitos construídos por
alguém, portanto muito abstratos e distantes da realidade do aluno.
A matemática não pode ser uma atividade
mecânica condicionada à aplicação de formulas, repetição e resolução de
algoritmos. Até mesmo os livros didáticos trazem pouca contextualização do
saber matemático. Tudo isso dificulta o entendimento e interfere negativamente
nos aspectos psíquicos de acreditar que é incapaz de aprender matemática.
A teoria Piagetiana considera o erro
como norteador da aprendizagem, pois permite diagnosticar o que o aluno não
aprendeu, indica o que o professor deve trabalhar e quais esquemas precisam ser
estimulados para que o aluno desenvolva as estruturas adequadas. Assim, a
avaliação deve ser investigativa, formativa, construtora de conhecimento e não
um processo seletivo, quantitativo ou classificatório.
A avaliação construtivista supõe a
construção de conhecimento e deve considerar o que o aluno domina, quais são
suas dificuldades e quais os caminhos necessários para provocar tal avanço.
Sendo assim, uma avaliação baseada numa prova de final de bimestre ou de ano
letivo é incoerente.
É muito mais eficaz a aprendizagem
matemática por meio de atividades que instiguem o aluno a pensar, que provoquem
a resolução de problemas e o levantamento de hipóteses. Os jogos matemáticos
também são uma forma prazerosa de aprender e construir conhecimentos, assim
como o uso de materiais concretos permite a compreensão de conceitos de forma
mais simples.
Bibliografia
GARDNER, Howard.
Inteligências Múltiplas: a teoria na prática. Porto Alegre: 2000, 1ª ed
KAMII,
Constance. A criança e o número. Trad. Regina A. de Assis. Campinas:
Papirus, 1990, 28a ed.
PIAGET,
Jean. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro: Forense, 1969.
STEEN,
Lynn A. (Ed.). Mathematics and democracy: the
case for quantitative literacy. Princeton, NJ: NCED, 2001. Tradução de Francisco
Duarte Moura Neto. Disponível em: http://www.bienasbm.ufba.br/MR1.pdf.
VYGOTSKY,
L. S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Livraria Martins Fontes, 1989.
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